domingo, 12 de abril de 2015

HISTÓRIAS DO SUL DA BAHIA-VI

TRIBUNA DA BAHIA
SEGUNDA-FEIRA, 28 DE JUNHO DE 2004
Sr. Redator:
A vila de Ferradas, hoje um bairro bem movimentado, localizada entre as cidades de Itabuna e Itapé, continua sendo um referencial histórico para a região do Sul da Bahia, ali em 1912 nasceu o escritor Jorge Amado, cronista da região cacaueira, internacionalmente conhecido.
Constituída basicamente de uma só rua (Ferradas Nova e Velha de casas simples) comprida, vale ressaltar os usos e costumes (bonitos e feios) dos habitantes, relembrando dentre outros, seus cantos de colheita e quebra do cacau, as grandes tropas de burros a conduzir sacas e mais sacas dos grãos para os armazéns de compra do produto localizados em Itabuna e regiões próximas ao porto de Ilhéus, destino final das super valorizadas amêndoas douradas, que navios cargueiros transportavam para o exterior. Atualmente chega-se ao cúmulo de importar-se o produto de outros países produtores, para tocar a indústria chocolateira local.
Pois bem, a nossa história aconteceu há muitos anos quando a região produzia e exportava com plenitude o cacau, gerando riqueza para alguns e situações de carência para outros, principalmente aqueles que trabalhavam na limpeza das roças de cacau, colheita, secagem e transporte do produto para os compradores.
Tempos bons aqueles em que a palavra dada era sinônimo de fiel cumprimento, nada de voltar-se atrás. Mesmo assim o dono de roças que não tomasse suas preocupações, perdia seus bens num abrir e fechar d’olhos.
Foi o caso de velho Manelão Simplício, que começou a tomar dinheiro adiantado para pagar com a colheita do cacau. Para tanto teria que assinar uma letra (Nota Promissória) para o Juca Barreto, um esperto comprador de cacau e, nas horas vagas, agiota muito ladino.
Tudo ia bem, até o dia em que Manelão morreu picado por uma casvavel, não se sabe de onde aparecera de debaixo de uma folhagem quando ele, manejava o podão para colher os frutos maduros, pisou sobre a bicha e, ela de imediato picou-lhe certeiramente. Foi uma picada só e, não houve chumaços e mais chumaços de querozene sobre a picada para impedir que ele fosse para o beleléu. Foi aquele chororó da viúva dona Adélia e seus quatro filhos.
Passaram-se os dias e Apolinário, empregado de confiança, além de suas atividades de cuidar da tropa de burros, dos trabalhadores da podagem e secagem, passou também acertar as contas do finado.
Num sábado, dia de feira foi até o escritório do Juca Barreto, saber das contas do finado.
Ali chegando ficou sabendo da existência de uma grande dívida de Manelão, cidadão que ele mesmo conhecia, cumpridor fiel de seus compromissos e por isso duvidava de tal dívida de mais de dez contos de reis, uma fortuna.
Voltou pra fazenda e contou toda a história para a viúva que também ficou a matutar sobre aquilo e, não teve jeito. Teve que vender a roça para pagar o débito e foi viver de favor na casa de um compadre, que se condoeu da sua situação.
Na verdade Manelão não devia um centavo ao tal agiota. O que acontecia era que todas as vezes que ele saldava uma dívida, o sabidório pegava a letra quitada, amassava-a e jo­gava-a dentro do lixo, dizendo: - Está tudo certo, compadre.
Quando precisar, é só me procurar. E quando Manelão deixava o recinto, mais que depressa pegava a Nota Promissória de volta e, ao chegar em casa, usando de um ferro de passar roupa estirava-a bem, para ficar como nova em folha.
E assim ele foi colecionando notas e mais notas promissórias, até o dia em que o tomador de empréstimos morreu e, de imediato o ladino Juca apresentou a conta à viúva.
Essa é a mais uma História do Sul da Bahia.

Egnaldo Araújo

Egval@terra.com.br

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